sábado, 25 de outubro de 2008

E a farsa montada no palco do cebolão ainda está longe de acabar

Véspera de segundo turno da eleição municipal. Fim de semana. Feriado. Dia do servidor público - o que, aliás, será que se festeja num feriado como esse?

Fim de mandato. Fim de feira. Fim de uma farsa em quatro atos, digo, quatro anos. E o elefante cinzento construído no cebolão da avenida Airton Senna esquina com a avenida das Américas diz a que veio: um absurdo viário-empreiteiro-demagógico-pseudocultural.

E nós, contribuintes e moradores da mui heróica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro preparemo-nos para bancar não só os 600 milhões de reais que já foram gastos, mas os muitos milhões mais que ainda pendurarão nas costas do município que, convenhamos, não está propriamente carente de espaços culturais.

Quosque tandem, César Maia, abutere patientia nostra?

Em texto de 2006, publicado no livro "Políticas Públicas de Cultura" editado pela FAPERJ, este escriba já apontara o descalabro da idéia.

E para coroar o absurdo, aparece o tresloucado alcaide comparando-se a Péricles (aquele do dourado e grego século V a. C.), ou a comparar seu Titanic particular com o Panthéon...

Vai-te tarde, César. Mas triste é saber que deixa-nos teu herdeiro legítimo, eleito por uma diferença de pouco mais de 55 moedas de prata.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Descoberta a pólvora!

Leio na manchete de primeira página do jornal O Globo que "empresas têm ganhos em excesso com especulação. 80 grandes companhias obtêm mais da metade do lucro em operações financeiras". Quanta novidade! Pergunto-me se a manchete é admirada para corroborar a cobertura da crise atual ou se é pela sua "novidade".

Notícias - que em inglês diz-se news - devem informar o leitor. Colocá-lo a par do que de novo acontece.

A teoria de informação ensina que quanto mais previsível um dado, menos informação ele carrega. Ou seja, a medida da informação é proporcional ao quantum de inaudito que o dado traz. E, convenhamos, as empresas passarem a preocupar-se tanto ou mais com a rentabilização de seu caixa do que com suas operações é, há muito tempo, do conhecimento - parafraseando Mino Carta - até do mundo mineral.

Um museu de grandes novidades

Na século passado era piada corrente que a General Motors seria um banco que, por "teimosia" continuava produzindo carros. Financiamentos a "taxa zero" de juros refletiam o poder dos bancos da indústria automobilística. O ganho para além dos custos e margens estaria embutido nos preços finais financiáveis. Vale mais a pena ter dinheiro para alavancar que produzir mais carros e vendê-los mais barato. Tais bancos de montadoras são, agora, candidatíssimos ao pacote bilionário de ajuda federal estadunidense.

Será que não é chegada a hora de rever o capitalismo?


Essa pergunta, antes insólita, vem ocupando as páginas, não dos tablóides dos partidos comunistas all over the world mas dos diários mais cotados do mercado, tais como "Financial Times" e "The Wall Street Journal".

Em algum momento do século XX, entre Bretton Woods - o tratado do pós-guerra que ordenou a finança internacional - e a exuberância irracional alcunhada por Alan Greenspan, o capitalismo enlouqueceu. Perdeu-se o referencial da economia real. Passamos de um capitalismo de negócios para um capitalismo financeiro quase sem perceber. Bem, sem percebermos nós, humildes mortais. Agências de classificação de risco, FMI, Banco Mundial e que tais, já há muito sabiam da super-bolha que agora vem explodindo na cara de todo o mundo.

Fornido na Basiléia, o último acordo inter-bancário preconiza uma alavancagem (o quanto um banco obtém de recursos com base em seu patrimônio líquido) "saudável" de até oito vezes (isto mesmo; 8 vezes). Trocando em miúdos: se um banco recebe de mim a quantia de um milhão para aplicar por um ano, pode empenhá-lo, neste período, valendo-se de operações complexas de securitização e mercado futuro, oito vezes.

É claro que a administração fiduciária do banco planeja prazos de entrada e saída de recursos de milhares de clientes, bem como uma gestão de carteiras de investimentos e alta taxa de spread (a diferença entre as taxas que o banco cobra de quem toma emprestado e paga a quem poupa) que permitem a ele uma liquidez e uma solvência ao longo do tempo - isso, óbvio, se toda a cadeia de compromissos (hipotecas, empréstimos, garantias de arrendamentos mercantis além de financiamentos diversos) for honrada.

O que acontece se não for? O que ocorre se resolvo resgatar meu milhãozinho antes do prazo, na boca do caixa, mesmo sendo-me imputada uma perda pela antecipação? Quebradeira geral. E é exatamente isto o que está acontecendo agora. E que aconteceu em 1929 - só que com uma "gigantesca" diferença. Agora os Estados estão socorrendo os bancos. E por que? Por que os Estados nacionais beneficiaram-se indiretamente da ciranda financeira e agora, para não cair em desgraça, estão colocando recursos - os nossos, pois que oriundos de impostos - na roda da "infortuna" que não para de cobrar o pedágio do efeito manada tão característico das bolsas-cassino em que se transformaram os mercados depois que apareceu o tal do "mercado futuro" (não aquele antigo, das commodities), mas aquele das apostas cambiais e dos debêntures a perder de vista...

Uma última "informação". Novidade mesmo: o Lehman Brothers, um dos poucos que faliram de verdade (porque a maioria está pendurada nos PROER da vida), ultrapassou em muito o tal limite razoável de alavancagem. Multiplicou-o por quatro. Chegou a apostar 32 vezes contra uma de patrimônio real, daqueles que se pode pegar com a mão. Aceita-se palpites quanto à profundidade do poço ou quando os mercados pararão de exigir o pobre dinheirinho dos contribuintes.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Arqui-té tu Brutus?

Não é de hoje que engenheiros extrapolam as suas habilidades e competências partindo para cima de áreas distantes da sua esfera de formação e atuação regulamentada. Escrevi sobre isso em meu último livro, quando trouxe à baila uma jocosa - mas real! - discussão que presenciei acerca de qual seria a profissão de Deus antes da criação. Os engenheiros têm certeza que Ele era, já, um deles. A falta do número do CREA no projeto deve-se a uma falha burocrática de jurisdição - não havia quem abonasse a ficha do Altíssimo.

Primeiro foi a Engenharia de Produção, outro produto do raciocínio criacionista aí de cima. Se algo é produzido, deve-se a um fato do engenho. E desabilite-se as profissões em contrário. Administradores sabem bem a que me refiro.

Esqueçam as velhas Biologia e Botânica - substituíram-nas pela Engenharia Genética e Florestal. Enterrem a Nutrição. Já raiou a Engenharia de Alimentos.

Até a produção artístico-cultural já deixou de existir depois que en-gênio-eiros inventaram a Engenharia Cultural, com matriz... na França!

No Brasil a novidade vem de uma outra sala do mesmo CREA - mais precisamente do gabinete dos arquitetos - uma tal de arquitetura cultural. Haja criatividade!

Se Zanine ou Niemeyer fizeram parte da banca que aprovou esta tese, prometo, adotarei o conceito

A questão do desenvolvimento de legítimas ações culturais - seja como ferramental de comunicação integrada de empresa ou não - ainda é instigante e merece muito mais atenção do quem tido na academia. Prevalecem as visões de mercado, emitidas por eminentes consultores - até bastante criativos, cheios de atitude (e de patrocinadores, também), mas, irremediavelmente presos às suas próprias práticas, seus próprios umbigos conectados à artéria-mór que é a Avenida Paulista.

Oxalá, do Pará ao Paraná, do Acre às Alagoas, surjam outros arquitetos, outros engenheiros e outros estudiosos de cultura, de marketing, de museologia, de artes e de comunicação, interessados em entender e encomendar o encontro da produção artístico-cultural com o mercado (sim, o mercado; de trabalho, de emprego, de estudo, de pesquisa, de fruição artística, de leitores, de cinéfilos, enfim, de públicos), algo que, inevitavelmente remete-nos à disciplina "marketing cultural", gostemos ou não do termo anglo-saxão.

Se há uma Economia da Cultura e se há um mercado cultural, há que nele realizar-se, competentemente, um marketing cultural. E não só pelas empresas patrocinadoras (essas mais interessadas em si mesmas e na promoção de suas marcas), mas, principalmente, pelos artistas, criadores, grupos e gestores culturais.

Saudações mercadológicas!

(Publicado parcialmente no Overmundo - 14/10/2008 - em comentário à matéria/texto acadêmico postado por Vanessa Gabriel).

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Desserviço global

Eles fizeram de novo...

E não é que o jornal O Globo, do alto de sua audiência (cativa... no sentido escravo, pois que sem outra opção na praça do Rio de Janeiro), fez de novo uma ação de má educação a seus leitores, principalmente aqueles que não o assinam ou compram, mas o "assistem" pendurados nas bancas?

Refiro-me à manchete de primeira página "Auto-suficiência em marketing", publicada na edição de 3 de setembro de 2008 e que se segue à cobertura da primeira extração (simbólica) de petróleo de um poço na camada pré-sal, no litoral do Espírito Santo.

E encabeçando a página 23, a coisa piora: "De muitas ações, restou apenas o marketing". Ai, ai.

Papa da Administração, Peter Drucker (1909-2005) não escreveu muito sobre marketing. Só o essencial: "marketing é muito mais que venda ou propaganda. É o negócio todo visto do ponto de vista do cliente – não é um mero departamento. Sua visão deve perpassar toda a organização".

Para William Stanton, outro estudioso pioneiro, o marketing consiste em "um sistema global de atividades de negócios integradas para planejar, atribuir preço, promover e distribuir produtos e serviços que satisfaçam necessidades de clientes atuais e potenciais".

Marketing é, pois, sinônimo de negócio

A palavra marketing só, desacompanhada, tem pouco ou nenhum sentido. Ganhará entendimento quando acompanhada: marketing automobilístico, marketing farmacêutico, marketing financeiro, marketing societal, marketing cultural ou, até, marketing político-eleitoral. (E no Brasil, como em outros países, há, ainda, uma dificuldade adicional; o termo não ganhou tradução do inglês).

Como ensinava o saudoso Manoel Maria de Vasconcellos, pioneiro do marketing no país), verdadeiramente o que há, no capitalismo, em oposição à economia planificada do socialismo, é um espírito de marketing - a melhor tradução que encontrou para o termo original marketing concept, traduzido, no nascedouro da atividade no Brasil, pelos idos dos anos 1950, como "produzir o que vende em vez de vender o que se produz". Uma atividade completa, pois, da pesquisa de mercado aos serviços pós-venda, faz-se marketing. Muito mais uma visão de desenvolvimento do que mera visão de propaganda ou de vendas.

Dadas as explicações técnicas, às perguntas

Por que será que uma empresa com o poder, a tecnologia e as melhores práticas de marketing, faz um tão mau uso desse termo? Não será por desconhecimento.

Por que não dizer "Auto-suficiência em propaganda" ou "Auto-suficiência em promoção" ou, ainda, e talvez mais correto "Auto-suficiência em assessoria de imprensa"?

Talvez porque O Globo seja um veículo da "intocável" imprensa. (Intocável porque poderosa, não porque ilibada). Talvez porque O Globo, assim como qualquer jornal do planeta, sobreviva unicamente às custas da propaganda de seus anunciantes - pois é sabido que venda em bancas e assinaturas não sustentam um diário desse porte.

E quanto dinheiro não foi gasto pela própria Petrobras, enchendo as burras de O Globo e de jornais, revistas e TVs pelo país todo, para fazer anúncios e fazer falar - via coleguinhas acocorados nas assessorias - sobre a auto-suficiência, em 2006?

Já havia abordado o tema da má vontade com relação ao termo "marketing" em matéria anterior, de 7 de agosto de 2007, neste blog, sob o título O meio e a mensagem.

É lamentável, ainda mais vindo de quem sobrevive do bom marketing realizado pelas organizações anunciantes (e através de suas competentes agências de propaganda), que um veículo com a penetração e a influência que O Globo desfruta, desfazer-se de maneira tão vil da atividade que dá sustentação a toda a mídia.

Sem dúvida um enorme desserviço ao avanço da sociedade fluminense. Talvez por isso - um verdadeiro tiro no pé -, entre outros fatores, é que não só as empresas anunciantes, assim como as agências, venham mudando-se, paulatinamente e sempre, para São Paulo, deixando à míngua de verbas, de profissionais e de talento a praça do Rio de Janeiro no setor da comunicação. Até a Rede Globo já opera mais, aí sim, o seu marketing, de São Paulo, embora continue fazendo o tipo "emissora do Jardim Botânico".

domingo, 31 de agosto de 2008

A China urbana esqueceu a China profunda

A banda de rock Guns'n'Roses promete há mais
de uma década um incensado novo álbum
intitulado Chinese Democracy.
Por que será que esse disco não sai?
Maldição provocada pelo próprio batismo
- de algo que simplesmente não existe.

Foi o tempo em que a China inspirava reverência. Não a China política, que sempre viveu entre guerras, aberturas e fechamentos, mas a China cultural. Ou pelo menos a China tipo "exportação" que nos chegava. China de Confúcio, de meditação e de sabedoria milenar. China da seda, do papel e dos fogos de artifício. China do budismo, da muralha e do chá.

O que dizer, no entanto, dessa avassaladora China comercial? Progresso ou tragédia? Não sabemos, pois há censura. Na TV e na internet. Para nós de fora e para os próprios chineses. Gripe aviária, justiça corrupta e comércio de órgãos para transplante. Escravidão em família, filhos explorados e filhas abandonadas à morte. Ameaças às soberanias de Taiwan, do Tibet e do Nepal. Sentenças de morte às centenas, pirataria até de automóveis e arsenais atômicos prontos para entrar em ação.

Quem se beneficia dessa China sem leis ambientais, sem leis trabalhistas, sem leis previdenciárias? São as grandes cadeias de lojas, as griffes internacionais e os atravessadores marítimos.

Esses honoráveis global players buscam negócios da China achacando patrões que não medem conseqüências quando exploram sua própria gente com jornadas de 20 horas diárias de trabalho mal pago. E mandam seus conterrâneos italianos, belgas, canadenses ou brasileiros embora p'ra casa.

E nós - como parece que esse próprio texto faz - condenamos esses absurdos apesar de sermos os maiores beneficiários do grande esquema internacional das lojas a 1,99 e que tais.

Olhe a etiqueta do seu jeans, de sua cafeteira elétrica (mesmo que a marca tenha charme alemão ou francês). Preste atenção às hastes de seus óculos. Prescrute as dobras dos artigos comprados na Burberry londrina em sua última viagem. Repare o brinquedinho distribuído no aniversário. E encontre o indefectível Made in China.

Choramos nossas tão preciosas vagas de trabalho terceirizadas ao gigante chinês mas não hesitamos em comprar quinquilharia chinesa nos camelôs everywhere.

E não é que o Brasil reconheceu junto a OMC (Organização Mundial do Comércio) a China como uma economia de mercado?

Resta-nos rezar para que as nossas autoridades não resolvam fazer de nós uma economia de mercado igual à China... e no próximo capítulo dessa tragédia em mandarim importar gente. Sim, gente-commodity, paga por tonelada, mais ou menos como no tempo dos navios negreiros. Teremos "chinavios" cheios de gente disposta a trabalhar por um prato de comida e um karaokê no fim do ano - exatamente como acontece com os jovens que abandonam o campo em busca de trabalho nas cidades chinesas. Hordas de consumidores de rap macaqueando o lixo ocidental, de tatoos a crack, de i-Pods a Big Mac, de Starbucks a All Star.

Se puder, prefira o produto fabricado no Brasil. Pense nisso. E aja. Antes que seja tarde.

Um retrato brasileiro do incentivo fiscal

As Olimpíadas acabaram, mas a China continua "no ar".

Para nós brasileiros as notícias foram do fiasco integral à consagração minguada dos poucos atletas de ouro, um deles totalmente "americanizado".

Estreamos este ano a lei de incentivo ao esporte. Inauguramos arenas multi-cores, parques super-aquáticos, ginásios poli-esportivos. Todos muito sub-utilizados após os jogos pan-americanos.

Quantos milhões a mais não foram gastos com a pressa e a improvisação de sempre amparadas pelo fato de que iriam significar "uma nova era para o desporto brasileiro". Ah... os políticos e seus discursos...

Quem, de verdade, é que precisa de incentivo?

A resposta parece fácil (e óbvia): o atleta, a equipe, os treinadores, o clube de regatas.

E quem, realmente, recebe o incentivo?

A resposta enrubesce: as teles, os bancos, os cartolas, as cervejarias, a mídia. Repetimos os erros das leis de incentivo à cultura que enquanto aquinhoam os artistas já consagrados, deixam à penúria quem precisa entrar no mercado.

Mercado?

Palavrinha traiçoeira, capaz de assustar os puristas de plantão. Mas no caso dos nossos atletas, exatamente como acontece com nossos artistas e produtores culturais, as leis de incentivo são utilizadas por quem pode mais, deixando à própria sorte quem pode menos.

Mercado nesses casos é - talvez só isso - mercado de trabalho. Trabalho que remunere com dignidade e que permita a alguém viver da dança ou da luta greco-romana, da música de concerto ou da ginástica, da ópera ou do atletismo.

Até o nosso multi-milionário futebol peca pela falência, saindo diretamente das páginas de glórias passadas de nossos craques para as policiais já tão familiares de nossos administradores futebolísticos.

É preciso corrigir os rumos da lei de incentivo ao esporte antes que ela se torne uma outra lei Rouanet, que mais frustra do que dá apoio a quem realmente necessita de incentivo; ou seja, trabalhadores em "início de carreira" e o próprio público "consumidor".

terça-feira, 22 de julho de 2008

Mercado Futuro: um futuro sem mercado

Acumulam-se as notícias sobre insolvência. De países, de estados, de cidades. Bancos e corretoras quebram todos os dias, mas o mercado financeiro impávido prossegue. Experimente ligar agora a sua TV (na sala, no quarto, celular ou PC).

O mundo de Bloomberg

Não importa a hora. Lá haverá um canal online realtime onde linhas de informação correm mais rápido do que você pode ler. A menos que você seja um adrenalinado corretor de valores. Remember "Wall Street: Poder e Cobiça", no título em português, genial "financial-thriller" de Oliver Stone.

Agora são as hipotecas estadunidenses que caem. E mais de 250 mil pessoas já perderam suas moradias - imóveis, agora, irremediavelmente vazios, pois não dinheiro para que alguém os compre, mesmo na bacia das almas.

Arrisco-me a deduzir que o fim do mundo - como a Bíblia o descreve - começou na metade da década de 90 do século XX, quando os mercados financeiros foram desregulamentados visando as aplicações offshore, "around the entire world". Esses mercados, essencialmente financeiros - daqueles que se descolam da economia real - giram um capital inexistente, muitas vezes superior às economias do mundo. E todos os dias muitos perecem para que alguém muito ganhe. É do jogo.

De frente para a semana-réquiem da rodada OMC de Doha, a que se arrasta por sete anos, coloca-se claramente o dilema do mundo: fome VERSUS energia num embate mortal para a espécie humana. Seja pela via da morte por inanição, seja por sede e guerras, seja pela poluição e débitos de carbono.

O que pouco se fala sobre as razões do fracasso da rodada, sempre apresentada com eufemismos tipo "falta de abertura", "subsídios agrícolas", "países industrializados VERSUS países em desenvolvimento" esconde o verdadeiro impasse: os países ricos querem impor aos demais a sua indústria de seguros e resseguros, de comunicação e de educação. A de cultura, de informática, telefonia e de bancos há muito já avassalou o mundo.

O G-7 quer trocar a queda de barreiras alfandegárias (mentirosa pois efêmera; depois o protecionismo disfarçar-se-á de cordão sanitário europeu ou o fim da fast track do executivo estadunidense) pela abertura ao capital estrangeiro nas universidades e nas emissoras de rádio e TV mundo afora. E ainda têm a cara de pau de constranger-se quase às lágrimas quando o chanceler brasileiro diz-lhes que sua lenga-lenga lembra Goebells, fabricando verdades a partir do discurso monocórdio de que são "do bem". Quem morrer verá.