sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Um acórdão para o Gilmar despertar...


"Os meios de comunicação têm, em sua natureza primordial, finalidade social e informativa, mas tais atividades devem ser exercidas com critério e segurança, sob pena de se colocar em risco a segurança e a honra subjetiva dos cidadãos e de responder, civil e criminalmente, por tais desmedidos atos".


Exemplar!

O texto é parte do acórdão exarado pelo desembargador Renato Ricardo Barbosa (da 19a. Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), condenando o jornalista Franklin Martins (junto com Marcone Formiga, jornalista que o entrevistou e a editora Dom Quixote, responsável pela publicação) ao pagamento de uma indenização de 50 mil reais a Fernando Collor por tratá-lo, em matéria publicada em julho de 2005 na revista "Brasília em Dia" como "corrupto, ladrão e chefe de quadrilha".

Como se sabe, o ex-presidente foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal das acusações na esfera criminal.

Franklin Martins informou que vai decorrer da decisão.

Não é sobre quem se diz... mas o quê se diz

Não vou aprofundar a questão sobre Franklin Martins (de que gosto) ou sobre Collor (de que não gosto).

O relevante neste caso é o alcance, para o bem ou para o mal, e a responsabilidade que há no produto do trabalho jornalístico - algo, em minha opinião, - de elevada importância. Tão elevada que justifica a formação do jornalista em curso de nível superior.

Como também se sabe, Gilmar Mendes foi o relator da decisão que cassou o diploma de Jornalismo como requisito para o exercício profissional. Talvez seja o caso de empreender um job de jornalismo investigativo em Diamantino, Mato Grosso, terra do ministro, e descobrir quem é que escreve o quê e aonde naquela cidade. E de quebra, também, como é que se resolvem por lá os casos de injúria, calúnia e difamação, pela mídia, uma vez que a Alta Corte dirigida por Gilmar também acabou com o direito de resposta, colocando nada em seu lugar.

Referência Cruzada

Na mesma edição do jornal O GLOBO em que foi publicada a notícia acima (18/09/2009), outra matéria, comentando a indicação de José Antonio Toffoli, por Lula, para a vaga agora aberta no STF, temos o seguinte entrecho:

"Antes, convocado para a sabatina [no Senado Federal], Gilmar [Mendes, atual presidente do STF] passou pelo constrangimento de ver a votação adiada por um pedido de vista, diante da apresentação de uma lista de processos em que aparecia como réu".

É de se perguntar em que gaveta dormitam tais processos.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Nota reveladora do conflito de interesses entre ser jornalista e estar assessor de imprensa

Começo fazendo um clipping da nota que saiu na coluna do Ancelmo Góis de hoje, n'O Globo:

Inimigo ao lado

Ontem, o senador Álvaro Dias
ficou um tempão falando
com uma pessoa com crachá de
imprensa sobre os planos dos
tucanos na CPI da Petrobras.

Era uma jornalista contratada

pela assessoria da estatal.

Resumo da lição dada por um mestre dos coleguinhas: esta atitude da assessora equivale a um ato de espionagem.

Pano rápido

Parece que a Petrobras, além de toda a carga dramática que traz desde Monteiro Lobato e Getulio Vargas, passa, agora, a paradigma de práticas - boas e ruins - de relações públicas e assessoria de imprensa em particular. Será que aprenderemos?

Relacionamento com a imprensa em dez lições:

1. Lugar de exercício de jornalismo é veículo de imprensa.

2. Quando um jornalista "muda de lado", passa a fazer comunicação empresarial (está aí a ABERJE* para confirmar).

3. No mundo civilizado, quando um jornalista faz comunicação empresarial, lhe é vedado continuar atuando paralelamente em redações, como acontece no Brasil.

4. Assessoria de imprensa é especialidade (e até sinônimo) de relações públicas no mundo inteiro - o que evita, ou pelo menos minimiza, o conflito ético de interesses. Cada perfil na sua.

5. Todo executivo quer sair bem na foto.

6. Logo, todos querem um jornalista para chamar de "seu".

7. E esperam que ele, com tráfico de influência, minimize os problemas e enalteça as virtudes - suas e de sua organização.

8. Isto vem mudando há décadas - pelo menos duas - mas alguns executivos ainda acham que funciona. E não é que, às vezes, ainda funciona?

9. É preciso jogar luz sobre as tais "relações com a imprensa", um tema especializado. Ninguém melhor que os estudiosos do Jornalismo e das Relações Públicas. Na escola - não é o único lugar - se aprende.

10. E deixar claro para todos o que se está fazendo, ou seja, no case acima, NUNCA a jornalista, sem ser da imprensa, deveria ostentar um crachá de "imprensa" - e, por isso mesmo, não deveria ter acesso ao plenário do Senado Federal.

Estar jornalista não é um condão. É uma condição. Jornalista não é só canudo, mas formação e conduta ética. Jornalista fora de jornal não faz jornalismo. Faz outra coisa.

Aconteceu, mas não virou manchete

Tive oportunidade de prestar consultoria a uma diretoria da Petrobras. Sob a "chefia" de um jornalista. Desses que não estão mais em jornais, mas cheio de amigos em jornais. Por isso o seu cargo.

Não sossegou enquanto não mudou o nome do "boletim interno Tal" para "Jornal de Tal". E tascou um "editor-chefe" depois do seu nome. E ainda mandou ver um número de carteira de trabalho. Estranho... eu também tenho uma, mas nunca escrevi o seu número em minhas produções...

Inventou com seus colegas uma "redação" e pediu-me uma "matéria" com determinado executivo. Recomendou:

- Leve o gravador!

Eu, que não sou jornalista, mas faço consultoria empresarial há trinta anos, redargui:

- Mas isto pode inibir o executivo... sei tomar notas taquigraficamente...

Ele respondeu, ríspido:

- É norma. Assim podemos ter uma prova do que escrevemos!

Eu:

- Prova? Estamos em alguma investigação? E depois, posso mostrar ao executivo o resultado da nossa entrevista para ele conferir.

Ele:

- Claro que não! Não se dá essa satisfação a entrevistado!

Eu:

- Mas o boletim, desculpe-me, o jornal, é do departamento - ele próprio sugeriu a "pauta". Só vamos publicar o que interessa a ele que seja publicado.

Ele:

- Só não use o gravador se o executivo não autorizar!

Fiquei aliviado. Nunca usei o tal gravador. Todos os executivos, sem exceção, pediam-me para que as entrevistas não fossem gravadas. Ficavam pouco à vontade... óbvio. E era um veículo interno da empresa, ora bolas!

Obs.: Esse meu "editor-chefe" usava um crachá em que estava escrito "jornalista" e não a função que ele exercia na Petrobras (mesmo num jornal de verdade os jornalistas não têm crachá estampado "jornalista", mas editor, redator, revisor...) e, para minha surpresa, quando levou-me ao executivo a ser entrevistado, apresentou-me assim:

- Esse aqui é o Marcondes, nosso repórter...

- Ai, ai.

* Sigla original da entidade Associação Brasileira de Editores de Revistas e Jornais de Empresa, hoje Associação Brasileira de Comunicação Empresarial.