quarta-feira, 21 de março de 2007

Prêmio SINCAF

O Prêmio SINCAF (suas idéias não correspondem aos fatos) - de inspiração cazuzística - vai para a edição de 20 de março de 2007 do jornal O Globo.

Talvez como reflexo do fortíssimo calor que assola o país nesse (fim?) de verão, o nível de contradição presente nas linhas e entrelinhas do periódico ultrapassou qualquer barreira desejável de controvérsia jornalística saudável. Senão vejamos:

1. No editorial expresso em Opinião e intitulado "Razão de Ser" (P. 6).

O veículo posa de guardião republicano defendendo que "... os meios de comunicação de massa são instrumentos essenciais para governos. Televisão, rádio e, agora, a internet se constituem veículos importantes para transmitir informações úteis a milhões de pessoas, de forma rápida e direta...", mas desanca a criticar a iniciativa do Governo Federal de criar uma Rede Nacional de Televisão pública, alegando que é "... imprescindível racionalizar as despesas públicas... ". Como parte de um dos conglomerados de comunicação do país - setor imerso em dívidas junto a entes privados e públicos a ponto de ter feito lobby por um PROER da mídia - o jornal esqueceu-se de somar às suas considerações a parte que cabe às emissoras de televisão nos rombos arrecadatórios de várias esferas, para o bem do país que "... passa por uma difícil situação fiscal... ". Outra pérola, tripudiando a estrutura (para lá de capenga) da comunicação estatal (TVEs, Radiobrás e que tais): afirmar que "... pela tradição, emissoras estatais servem para empregar apaniguados de esquemas político-partidários, e por isso mal aparecem nos sistemas de medição de audiência". ANCINAV neles. Esquecem-se, mais uma vez, senhores da mídia que se dizem primeiro-mundistas, que nos países desenvolvidos, conselhos plurais de comunicação influem no que vai pelo ar e pelos cabos, dando voz a todos os segmentos de público representados, de indígenas a homossexuais, de minorias religiosas a intelectuais, e que conteúdo que se veicula através de concessão pública constitui matéria para ministérios de cultura e não para todo-poderosos ministérios de comunicações ("acemísticos" aparatos dos anos de chumbo), ou seja, repartições meramente carimbadoras responsáveis por satélites, antenas, cabos e tomadas.

2. Na opinião expressa no quadro Opinião e intitulado "Hora do Consumidor" (P. 17).

Comentando a mudança de controle acionário do Grupo Ipiranga, "... na busca de ganhos de escala... como em algumas outras indústrias... ", o periódico quer ver agora tratado "... o interesse dos consumidores... junto aos organismos de defesa da concorrência... ". Esquece-se - de novo! - o veículo, de que, parte de um conglomerado de comunicação que, a exemplo dos demais grupos donos da mídia brasileira, não se quer submeter a qualquer julgamento crítico em relação à sua própria fatia no oligopólio. Porção essa tanto de audiência quanto de profissionais de comunicação. Há tempos o conglomerado funde-se internamente e adquire no mercado outras operações e seus profissionais produzem conteúdo indiscriminadamente para seus veículos. Se no passado havia uma pluralidade de redações, hoje se lê com freqüência, nas páginas do jornal O Globo, matérias produzidas pelo Extra, pelo Diário de São Paulo, pela Globonews(!) e pela CBN (!). "Mais-valia, a gente vê por ali".

3. Noticiando o veto (viva!) da ANATEL à compra de TV a cabo pelo Oi (P. 21)

Uma das maiores beneficiárias (pela quantidade recorde de anúncios que veicula) da guerra da telefonia instalada no país pelo governo FHC, a rede de televisão coligada ao periódico não foi citada pela reportagem, a qual também esqueceu de tecer considerações sobre um dos mandamentos da privatização cardosiana, aquele que vetava a um mesmo grupo atuar numa mesma área geográfica com telefonia fixa e móvel. Anunciante campeã de audiência, a agora "convergente" Oi não deve ter ficado muito satisfeita com a matéria. Afinal, a líder da TV aberta (e "fechada" também) suprimiu da concorrência a possibilidade de veicular suas imagens por assinatura - privilégio da coligada NET - e atuou fortemente no lobby que seu ex-colaborador mais que estrategicamente imexível ministro foi "vítima" na implantação do modelo (japonês) de TV digital - que, (in)justamente, impede que as empresas de telefonia atuem na produção própria de conteúdos, ficando dependentes das emissoras já existentes para apenas repetirem a sua bebebéia programação.

Patrocínios Petrobras: moeda de duas faces.

A Petrobras é a maior empresa da América Latina e atua em uma área - energia - na qual encontram-se as mais poderosas corporações do planeta. Uma organização dita de classe mundial, com ações na bolsa de Nova York (em categoria máxima de governança corporativa, leia-se: transparência, satisfação ao acionista e preocupação socioambiental), presença global e, até, patrocinadora-parceira de uma escuderia na Fórmula 1, meca das indústrias que gravitam a área que, ao lado da energia, comanda os maiores negócios mundiais, a indústria automobilística.

Orgulho brasileiro desde a sua fundação, por Getulio Vargas, em 1954 - a partir da campanha nacional "O petróleo é nosso", a Petrobras passou por crises mundiais (como os choques do petróleo de 1973 e 1979), regionais (como a recentíssima onda "nacionalizante" na América Latina, que rendeu a perda de investimentos antes julgados permanentes na Bolívia) e nacionais (como a tentativa de rebatizá-la "Petrobrax" no governo criativo-privatizante de FHC), mas sobreviveu e hoje passa por um momento de rara conjugação de fatores positivos, internos e externos, que tem-se traduzido em crescimento, consolidação de posicionamento (como na recente aquisição, com parceiros, do último grupo brasileiro privado na área dos combustíveis, o Ipiranga) e demonstração de capacidade inovadora (como sempre, na exploração de petróleo em águas "cada vez mais" profundas, no biodiesel e, agora, na americanizada "febre" do etanol).

Não é absurdo, pois, que tamanha pujança se reverta na presença da marca Petrobras tanto na mídia quanto nas mentes e, de fato, a empresa é a maior patrocinadora na área artístico-cultural desde que o campo do marketing cultural surgiu, por assim dizer, em 1986, a partir da legislação de incentivos fiscais à cultura inaugurada pela Lei Sarney. Sua atuação rivaliza com o próprio Ministério da Cultura. É memorável o patrocínio exclusivo da Petrobras ao Projeto Pixinguinha, da FUNARTE, na década de 1980, talvez a mais bem sucedida experiência de apoio de uma empresa a programas de difusão e promoção da cultura em todos os tempos.

Não se deve estranhar o fato de a Petrobras assumir integralmente a política praticada pelo Governo Federal na área da cultura, afinal, o governo brasileiro detém o controle acionário da Petrobras, apesar de nem ser mais o maior detentor de ações da empresa - a maioria de seus papéis circula em bolsas, o que, em tese, significa "em poder do público". (Isto aliás reflete a mudança de paradigma do que seja hoje considerado uma empresa pública. Longe do velho conceito de estatal, empresa pública tornou-se o conceito de organização que deve satisfação ao público, mas isso é tema para uma outra matéria). Por deter o controle da empresa - ou do grupo, já que a Petrobras encabeça um conglomerado de pessoas jurídicas, sendo a Petrobras Distribuidora de Combustíveis a maior delas depois da companhia de exploração e produção de petróleo - o governo brasileiro impõe integralmente a ela (e também às outras empresas controladas pelo Tesouro Nacional, tais como Eletrobrás, Infraero, Correios) a sua política de apoio à arte e à cultura.

Como um player de porte gigantesco e capacidade de investir com peso em tudo aquilo que mira em seus objetivos, a Petrobras realiza um trabalho exitoso de promoção institucional com seus patrocínios - para lembrar apenas um, basta citar os já vinte anos de apoio à Orquestra Pó-Música do Rio de Janeiro, depois rebatizada Orquestra Petrobras Sinfônica, sua atual denominação. Seu Programa Petrobras Cultural garante a realização de filmes - de curta e longa metragem -, festivais de música, resgate da memória nacional, eventos na área das artes plásticas e cênicas, entre outras iniciativas, marcando presença nos olhos e ouvidos de relevante massa de audiência. Porém, e nesse porém reside uma outra face da moeda, marketing cultural é uma atividade que, ao lado de significar a viabilização do empreender artístico-cultural, ou seja, a aplicação do espírito de marketing a esse setor da atividade humana, deve, também, dar curso a ações que coloquem a marca de patrocínio de uma organização à altura das marcas de seus concorrentes.

A batalha por corações e mentes na área da energia é global. Mesmo. Note-se as incursões internacionais recentes da estatal venezuelana PDVSA que atingem até o Brasil, indo do desejo manifesto de comprar a Ipiranga até a decisão de patrocinar desfile de escola de samba no Rio de Janeiro. Nesse aspecto - internacional - a política de patrocínios culturais da Petrobras deixa a desejar. Concorrendo planetariamente por posicionamento no imaginário de consumidores, parceiros empresariais, governos, fornecedores e concorrentes, a Petrobras deveria adotar, também, ações globais, com impacto comunicacional ampliado para além das nossas fronteiras. A empresa já obtém esse resultado com algumas ações pontuais - o patrocínio a turnês da Companhia de Dança Deborah Colker é um deles - mas tal retorno é ínfimo frente à sua estatura e diante de concorrentes tentaculares como British Petroleum, Shell, Exxon Mobil e Repsol.

É natural que realize essa "internacionalização" das ações de patrocínio a partir do insumo artístico-cultural brasileiro. É de se esperar que a Petrobras transpire brasilidade. Para citar uma ação nessa linha, já faz parte da história, por exemplo, a importância que teve o grupo holandês ABN-AMRO na divulgação recente da obra de Van Gogh.

Por outro lado - voltamos à face nacional da moeda - soa estranho a Petrobras "patrocinar" a Escola Nacional de Circo ou a reforma da Escola Nacional de Música. Por definição, tais instituições deveriam receber transfusão de vida diretamente do Tesouro Nacional, via Ministério da Cultura e não de uma empresa deste ou daquele ramo de atividade e, portanto, algo sujeita a intempéries de mercado e dos humores dos executivos de plantão. Por este modo de ver, o patrocínio "empresarial" da Petrobras parece (e é) dirigismo estatal que se sobrepõe aos interesse (legítimos) comerciais da marca. Muito mais apropriado seria a Petrobras figurar como a mais importante carreadora de recursos para o Fundo Nacional de Cultura (via leis de incentivo) e este, sim, fazer os aportes necessários e permanentes às instituições perenes da estrutura de preservação, fomento, difusão e proteção da cultura do país.

Ambas as questões aqui abordadas - tanto o frágil marketing cultural realizado pela Petrobras quando vista como global player, quanto a questionável onipresença de sua marca onde deveria estar ostentada a marca do MinC - são excelentes objetos para aprofundamento de estudiosos do tema e de seus correlatos, tais como gerenciamento de marcas, patrocínio, filantropia, empreendedorismo, captação de recursos, terceiro setor, responsabilidade social e cidadania empresarial o que, no Departamento de Relações Públicas da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro constitui uma das razões de ser e de trabalhar da Coordenação de Pesquisa e Documentação em Comunicação e Mercadologia Prof. Manoel Maria de Vasconcellos (CPDCOM), hoje realizando a 13a. turma de seu curso de atualização (em 75 horas) "Marketing Cultural: Teoria e Prática" e a 3a. turma do curso de aperfeiçoamento (em 180 horas) "Gestão e Marketing na Cultura".

segunda-feira, 12 de março de 2007

Lula e o pé na jaca

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O ponto jê (ou tapuia) do Lula localiza-se no pé.

Afinal, em suas típicas palavras; "estamos convencidos de que pontojê se escreve com jê de jaca".
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