sábado, 28 de março de 2009

Comentário de um remanescente da era dos átomos

Nicholas Negroponte "marcou um gol" quando em seu livro A vida digital (1995) dividiu a economia em duas eras: a dos átomos e a dos bits. A primeira, bricks and mortar; a segunda, e-business.

É inegável o avanço que as tecnologias (de hardware, de software, de peopleware e até de um... mindware) proporcionaram em termos de produção, eficiência e riqueza. É inigualável, também, a contribuição que a chamada T. I. trouxe ao conhecimento e àquela área que administra - ou quer administrar - o conhecimento: a educação.

Mas - sempre tem um mas - em termos de educação, há algo mais a considerar: todos nós, dos nonagenários nascidos no início do século XX aos “Y generation”, fomos educados em um sistema formal - pré-internet - baseado em escolas, disciplinas, metodologias e crivos quantitativos e qualitativos de saber – sendo, estes últimos, cada vez mais rigorosos em termos de fontes, referências, testagem e comprovação empírica.

O sistema acadêmico universal, ainda em vigor (e não diviso nem uma sombra pairando sobre ele) sempre foi uma construção coletiva de conhecimento. Cada tese de doutorado, pelo seu caráter referencial ao que fora feito antes e de adição de um conhecimento inédito, torna-se um "tijolinho" do edifício de sua área, esta bastante bem delimitada no contexto das ciências sociais, humanas, biológicas ou tecnológicas.

Há transversalidades. Saberes que desafiam o status quo compartimentado dos departamentos universitários, mas que mesmo assim têm o endereço de equipes ad hoc multidisciplinares controlado pela academia e centros de pesquisa. Mesmo as empresas que inovam com fins lucrativos alimentam-se do conhecimento que, produzido academicamente, recorre a agências de fomento muitas vezes financiadas por recursos públicos.

Bottom line

Há que se render, ainda, a parâmetros de "velha" economia dos tijolos e argamassa. Já escrevi que a universidade brasileira se reengendra ou morre, mas, por ora, seu modus operandi sobrevive, mesmo que aos trancos e barrancos.

As revistas científicas são online mas os experimentos médicos, técnicos e sociais têm que ser bastante palpáveis - passam por estudos de campo, envolvem pesquisa de opinião pública e de mercado, experimentações em laboratório e em centros de pesquisa médico-farmacêutica, passam por testes de materiais e implicam na construção de modelos aerodinâmicos aprovados em túneis de vento... e por aí vai.

O mesmo traço “físico” ocorre com o livro. Em plena passagem da era "atômica" à digital, o velho calhamaço encapado, de folhas cortadas e coladas ou costuradas, sempre foi mobile e mais, não requer bateria (poluidora) de lítio ou cádmio e nem corrente elétrica ou iluminação. Vai onde quisermos. Na noite, uma vela (acesa!) basta. Pode até ser um pouco amassado para caber no bolso do paletó. E para produzi-lo ainda se precisa de alguém que o edite. Isto dá a credibilidade inicial. A final virá da essência que o próprio conteúdo carregue - fruto de suas fontes e referências.

Blá Blá Blá “na nuvem”

A wikipedia carece muito dessa credibilidade essencial. Alguém pesquisou e encontrou 1.070.000 referências no Google para a palavra “brogue”. Muuuiiito lixo. Andrew Keen, criador de várias empresas baseadas na internet e autor do livro O culto do amador (2007) adverte: “é a celebração do amadorismo – qualquer um, por mais mal-informado que seja, pode publicar um blog, postar um vídeo no YouTube ou alterar um verbete na wikipedia. Essa anonimato da web - uma mistura de ignorância com egoísmo, mau gosto e ditadura de massas - põe em dúvida a confiabilidade da informação. E a distinção entre especialista e amador torna-se cada vez mais ambígua...”.

Eu mesmo posso relatar uma experiência nefasta. Tendo realizado uma pesquisa ao longo de anos, no interior do sistema universitário (especificamente no âmbito da USP), tive o lampejo e a generosidade de postar um texto referente aos meus achados incluindo na wikipedia um verbete sobre o "meu" tema, marketing cultural. Pois não é que um anônimo retirou-o? Nova tentativa, e novo “veto”. E o cidadão ainda direcionou os ponteiros da pesquisa de quem quer que fosse buscar na malfadada enciclopédia gratuita e virtual o termo “marketing cultural” para um canhestro conceito que o mesmo explora em seus empreendimentos, o de (sic) 'arquitetura cultural'. Um acinte – sobrepor um interesse particular a um achado legitimamente reconhecido pelo sistema acadêmico vigente. Felizmente encontrei alguém com credibilidade (no caso, a editora Ciência Moderna) para publicar o resultado de meu suado trabalho.

E não é que meus alunos de graduação na disciplina "Produção de Eventos" querem realizá-los sentados diante do computador?

Por isso, caros amigos, ainda temos que aprender e fazer muito pelos novos suportes tecnológicos do conhecimento. E enquanto não fazemos isto vigir, utilizar as regras do jogo atual da melhor maneira possível, realizando nossas pesquisas no campo (mais que na web) e publicando nossos livros por meio de alguma editora que não seja “a do autor”.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Até que enfim... a Lei Ferreira

Parece até conto da carochinha, mas a uma semana do primeiro de abril, o Ministério da Cultura, finalmente (e bota "ufa!" nisso) abriu a consulta pública (de 45 dias) que pode mudar os rumos do patrocínio no Brasil.

Sonhada por mim, querida por você, pedida por nós, clamada por vós e por todos, a reforma (sempre) anunciada e (ainda não) executada pelo governo federal já é maior de idade, uma vez que as críticas fizeram aniversário de 18 aninhos junto com a própria Lei Rouanet - e a esta altura o ex-ministro deve estar torcendo para sua "filhota" sair de casa, casar e mudar de sobrenome. Quem sabe o comprido Passos Gil Moreira ou, talvez, o mais econômico sobrenome de (Juca) Ferreira.

Deu n'O Globo

Entra ministro, sai ministro, desde 1991 se sabe que o patrocínio às artes e espetáculos no país virou oligopólio. Segundo o ministro Ferreira, 3% dos proponentes abocanharam e decidiram sozinhos o destino de 50% do (pífio) bilhão de reais da renúncia fiscal havida em 2008.

Eventual política de eventos culturais

É uma árvore de Natal aqui, um Cirque ensolarado ali, um Canecão lá, um Vibezone acolá e pronto; acabou-se o recurso do incentivo com aqueles que, convenhamos, não precisam de incentivo algum, pois que já contam com o nosso "incentivo" de servos-consumidores. E nem assim, com uma galera-mecenas de milhões de almas, a TIM deixou de chutar o balde do ex-Free Jazz Festival... ou seja, patrocínio continuado no Brasil é... vento...

Eterno sonhador, iludo-me que talvez algumas de nossas corporations, hoje tão citizens, tenham aprendido a lição do genuíno marketing cultural como um (belo e eficaz) meio de promoção institucional e relações públicas e permaneçam no mercado de patrocínio, viabilizando quem precisa de modo contínuo, não-eventual, e bem longe dos gerentes tupiniquins de marketing que, ao patrocinar um Picasso, estão, de fato, com o coração e a mente no volante de um Citroën.

Saiba mais sobre a terceira geração do marketing cultural.