domingo, 6 de fevereiro de 2011

Sobre tubarões e outros peixes...

>
Piranhas, talvez...

Já havia decidido manifestar a minha indignação acerca da matéria públicada na penúltima edição da revista EXAME, na qual o presidente da AMIL é personagem de capa. Perfil acabado de um case de sucesso, as práticas da empresa - e de todo o setor - revelam aquilo que há de pior no capitalismo. Do líder: "prefiro estar no cardume de tubarões ao de sardinhas...".

Aí, então, veio o - ótimo - texto de Ligia Bahia, publicado hoje na seção OPINIÃO do jornal O GLOBO, tratando da seguinte história de pescador: planos de saúde VERSUS seguro saúde e outros babados. E desvelando a malfadada "comunhão de bens" entre os planos de saúde e o SUS ("o SUS se converteu em fonte de subsídios aos planos privados"). Isso mesmo, o nosso Sistema Único de Saúde. Talvez o maior e mais sofisticado dos sistemas públicos brasileiros. Mais do que o de educação, maior que o de seguridade e anos-luz à frente do de defesa pública. E inspiração do recém-sancionado (em dezembro de 2011) Plano Nacional de Cultura (com seu estrutural Sistema Nacional de Cultura).

Cá e lá

Obama fez parte da lição de casa que os Clinton começaram, mas continua travando, no Congresso, a batalha pela universalização dos serviços de saúde - algo hercúleo, admita-se - que tramita nos EUA desde o pós-segunda guerra.

Pedagogia de uma crise

Aí, para completar, fui à locadora mais próxima e peguei "Sicko", o filme que Michael Moore fez, em 2007, sobre o sistema de saúde estadunidense.

Logo na introdução são mostrados casos de infortúnio dos "50 milhões de americanos que não têm seguro de saúde", mas é informado que o filme "não é" sobre esses personagens, mas, sim, "sobre os 250 milhões" que detêm essa invenção única da indústria financeira.

Sim, indústria financeira

Quando trabalhei em consultoria, testemunhei a transição das empresas do - antigo - ramo de saúde (health care) para o de seguros (financial services). Anos 1980. Nos Estados Unidos um pouco antes - 1971, com o insuperável Richard Nixon (que no mesmo ano abandonaria o padrão-ouro como lastro econômico do dólar... o resto é história de crises que se repetem em intervalos cada vez menores até hoje).

Aí o começo do fim da relação médico-paciente, do ingrediente "solidariedade" que presidia a abertura de uma clínica num bairro, do juramento de Hipócrates. Passamos a ser insumo de uma indústria cujo fim não é a saúde, mas o lucro. Meros números somos, e "quanto menos cuidados, melhor", como afirma um dos muitos tubarões entrevistados pelo cineasta.

Benchmarking para ninguém botar defeito

O depoimento de uma funcionária de call center dessa indústria ilustra, sem retoques, o mau atendimento que recebemos. Segundo ela "por isso sou grossa com os segurados, não quero me envolver com eles, com os problemas deles. Não aguento a pressão de ver pessoas alegres porque estão 'comprando' uma solução para seus problemas quando sei, já no preenchimento da proposta, que em duas semanas suas coberturas serão negadas". É a infâmia das condições de saúde pré-existentes. Here, there... and everywhere?

Então vemos os exemplos da Inglaterra, da França e do Canadá, países em que a cidadania conquistou patamares inimagináveis para nós, brasileiros. E um ex-congressista britânico dá a fórmula da vida de gado (remember Zé Ramalho): "primeiro você faz as pessoas quebrarem, depois as humilha e, por fim, as faz terem medo".
>

sábado, 22 de janeiro de 2011

A teimosa sigla MEC reivindica. Tragam a cultura de volta para casa.

>

Matéria de hoje, no jornal O Globo, intitulada “Cultura de abandono”, dá conta de (mais um) descaso público –, no caso, com a desimportante(*) tarefa da Cultura.

Centros culturais abandonados, nada divulgados, mal geridos, pouco procurados pela população da cidade que – ainda, teimosamente – se quer capital cultural do Brasil.

Some-se ao descuido com os citados espaços Laurinda Santos Lobo, Oduvaldo Vianna Filho, Hélio Oiticica e Parque das Ruínas, a situação da mastodôntica Cidade da Música Sem Nome (pois que a família, esperta e sabiamente, abriu mão da “homenagem” a Roberto Marinho perpetrada por aquele alcaide maluquinho).

Qual Titanic encalhado, a obra parece assombrar a Prefeitura – que não a inaugura pois sabe que, dado o “pontapé inicial”, terá que “administrar” a falta de gestão, a falta de programação e a falta de gente (à frente e por detrás das cortinas) de suas nababescas instalações, que custam ao contribuinte algo como 1 milhão de reais a cada mês, só pelo fato de existirem. Sem acender, sem funcionar, sem nada.

Talvez seja hora de, finalmente, reconhecer-se um erro histórico e cuidar do ambiente, cuidar da defesa civil, cuidar das mudanças climáticas, cuidar da gestão de águas e esgotos, cuidar dos trens, das vias e do ir e vir aéreo e aquaviário, e trazer a Cultura de volta à esfera da Educação (pois que não há uma sem a outra).

A Educação, pelo menos, ainda tem orçamento para funcionar. A Cultura quase não tem e o pouco que tem ainda se contingencia. Noutro dia o MinC informava que chegaria ao orçamento de 2010 se as “praças do PAC” – seja lá o que isso for – fossem incluídas, ao lado das emendas de parlamentares (algo absolutamente nefasto do nosso sistema político) que, se retiradas, significariam perda de 60% da pífia dotação de nem 0,2% do PIB brasileiro (a Unesco recomenda o investimento de, pelo menos, 1%).

(*) Nem um partido político no País ambiciona gerir secretarias, fundações e, até, ministério, quando o assunto é Cultura.

>

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Baixo Biltre Brasil 2011.

>
No lugar dos valores da vida, preferiu-se o poder, o sucesso e a riqueza por si mesmos.
Sigmund Freud, 1930.

Sobram os atormentados pela miséria moral e material porque escasseiam fiéis dispostos à renúncia, decorrente das exigências dos ensinamentos do Senhor. Em consequência, avolumam-se os seguidores de uma anticultura, a do consumo, a do prazer, a do prestígio, a da busca desenfreada do dinheiro e do poder. Não são contestados com vigor pelos que deveriam sentir-se obrigados a fazê-lo. A coragem é necessária em nossa época onde predomina a covardia.
Dom Eugenio Sales, 2010.

E o mais nefasto fato (pelos milhões de almas que afeta) até aqui, neste ano; mais que as chuvas (pois que voluntário), mais que a briga podre de PT e PMDB pelo butim ministerial (pois que dispensa intermediários para faturar), ou mesmo "o Oklahoma do Obama" (pois conta com o beneplácito de todos os que se encontram no poder), é a produção de mais um BBB pelas onipresentes Organizações Globo. Com o testemunhal do casal 'família' Videogame-Caldeirão numa das quotas de patrocínio.

E, para quem mora no Rio de Janeiro, quase não há saída, a não ser dar uma espiadinha... nos salões de cabeleireiro, consultórios dentários, restaurantes, táxis...

Só quem já viveu em outra cidade, em outro estado, consegue sacar, mesmo que só desconfie, intuitivamente, o que é a presença de uma mídia hegemônica - que nem precisa ser monopólio, pois que programas (em outras emissoras) como o "Pânico" e "TV Fama" tratam de cartelizar a "globalizada" (como canta o samba-enredo institucional da Rede Globo ora no ar, aliás) audiência em mais uma ação entre amigos do PGI [Partido da Grande(?) Imprensa(?)].

Entretenimento (de baixo nível cultural): 10
VERSUS
Jornalismo (a serviço dos patrões): 1

Disfarçados de jornalistas (a propósito, nunca se viu tantos jornalistas travestidos de garotos-propaganda como agora), os vendedores de sonhos impossíveis de consumo às entrantes classes C, D, E, F, G, H, se refestelam em salários dignos (?) de Ronaldinho Gaúcho para empurrar goela a abaixo seu fantástico show da vida.

Quando se fala em controle social da mídia – algo que existe em todos os países civilizados, claro, sendo o "ar" propriedade do Estado e, portanto, vetor de serviço à cidadania – enraivecem brandindo a liberdade de imprensa, omitindo que mais de 90% da programação que produzem e despejam na audiência indefesa é de entretenimento e não de noticiário.

– Mudem de canal! Os pais podem monitorar o conteúdo que seus filhos assistem... É o mote daqueles que não gostam da argumentação acima. Quantos pais e mães das classes C, D, E, F, G, H estão nos lares "cuidando da mídia" que seus filhos entornam diuturnamente?

E ainda cobram do Governo o cumprimento do Artigo 222 da Constituição Federal!

Vide matéria clipada em 04/01/2011 a respeito no link a seguir:

http://www.marketing-e-cultura.com.br/website/clipping/clipping-abcd.html

Desinformação até nos ônibus

No Rio, agora, além das salas de espera, você encontra o – cada vez mais frequentemente constrangedor – produto global também nas telinhas dos ônibus "quentões". E parece que o estado de tela quente ainda piora o conteúdo: informações imprecisas, dados jogados ao acaso, bobagens travestidas de notícias, factoides promocionais, erros de português aos montes e muita, muita propaganda das próprias Organizações.

E campanhas para todos os gostos. Fotografe a sua comunidade! Seja repórter por um dia! Globo e você - já são dois gritando! Quero o "meu" Rio... Merchandising social nas novelas - "cidadania..." (na voz daquele locutor que fez sucesso na Rádio Cidade, mas que as Organizações aprisionaram em um bunker – nunca mais foi visto) – "... a gente vê por aqui". Pior que isso só o bíblico Cid Moreira clamando, crédulo... oh! Mister "M"...

Sem o concurso do mascarado mago, o que vem por aí é "mais um campeão de audiência", conduzido pelo talvez mais dissoluto dos núcleos globais (a disputa é ferrenha). E com direito a recomendação, na véspera, do bonna gente Totony Ramos no imperdível programa menos inteligente Mais Você.
>

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Mensagem para a virada 2010/2011.

>
Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.

Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.

Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.

Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez,

Com outro número e outra vontade de acreditar que daqui p'ra diante vai ser diferente.

Carlos Drummond de Andrade
>

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Última - culta e feia - pá de cal no ensino do jornalismo (nativo).

>
Se há unanimidades com as quais tenho me deparado nos últimos 25 anos de atuação na esfera da Comunicação Social - seja como profissional, docente ou pesquisador - estas são: a cantada "isenção" e a decantada "independência" das redações em relação aos departamentos comerciais nas empresas jornalísticas.

Embora seja cada vez mais nítida a influência dos "negócios" sobre o noticiário, principalmente em relação ao que NÃO é publicado, os coleguinhas jornalistas insistem num ar blasé quando dividem corredores com publicitários e relações-públicas, tanto na academia quanto nas empresas.

Há vinte anos, Ben Bagdikian já nos alertava quanto ao monopólio da mídia, título, aliás, de seu livro. Na mesma época a BBC produziu o documentário "Beyond Citizen Kane", relatando o quanto o poder das 99 "organizações" de Roberto Marinho (o grupo Silvio Santos tem 44 empresas) "cartelizava" o respeitável público: à moda fordista, "você pode assistir a qualquer tipo de programa, desde que seja na Globo ou em qualquer outro canal Globosat", ou "você pode escolher qualquer jornal, desde que seja O Globo ou Extra ou Diário de São Paulo ou Valor Econômico", e, ainda "você pode ouvir qualquer rádio, desde que seja CBN, Rádio Globo ou Beat 98" etc. etc. etc. Juntando à massa, ainda, Globo.com, Som Livre, Época, Editora Globo e Globo Filmes, sobra, de fato, pouquíssimo espaço do nosso dia para chegar à janela e respirar, digamos, um ar menos "globalizado".

Cai o muro

E então, a inefável ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), lança seu curso de Jornalismo. Cairá, pois, a divisória entre a redação e o departamento comercial, uma vez que o programa do curso inclui eixos "pérolas" como "comunicação com o mercado" e "comunicação empresarial".

E, também, por que não? Lança-se, também, junto e misturado, um curso de pós-graduação, "totalmente voltado às necessidades do mercado".

Os experientes botões do paletó de Mino Carta decerto quedarão pasmos diante do "corpo docente", composto de "medalhões", entre patrões e bosses de redação que, claro, conhecem muito de negócios.

A revista da ESPM pergunta em sua capa:

- Para onde vai o jornalismo ?

Arrisco um palpite:

- Com esse tipo de proposta... vai direto para a caixa registradora dos anunciantes.
>

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Reputação é a bola da vez. Na gestão e em tudo o mais.

>
Matéria muito interessante publicada hoje, no jornal O Globo, dá conta de que vivemos numa sociedade digital. Digital mesmo, na qual "falamos pelos dedos" - nas palavras de Thomas Pettitt, professor de História da Cultura na Universidade do Sul da Dinamarca.

Para ele, que toma emprestada a expressão "Teoria do Parêntese de Gutenberg" do colega Lars Ole Sauerberg, estamos saindo de uma revolução de mais ou menos uma década, na qual a imprensa e os livros estão saindo de cena, dando lugar a um mundo pré-Gutenberg, de tradição oral e comunicação falada. Digitamos rápido como falamos. Editamos rápido como pensamos.

Essa teoria, de fato, explica algumas coisas; além da "analfabeta" e verborrágica internet; o fortalecimento do meio rádio e das relações públicas - uma vez que, em tempos de comunicação falada, a credibilidade da "fonte", ou seja, a reputação do falante, passa a ser "chave" -, termo usado pelo próprio Pettitt.
>

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Depois de vinte dias de férias... poema concreto.

>
Um admirável panorama "novo" nas manchetes. Em sete linhas:

Presidenta.

Cristina s/ Kirchner.

Piñera fazendo besteira.

Quer Evo saída para o Pacífico.

Obama sucumbindo ao Tea Party.

PMDB pressiona p/ cargos e influência.

Como indagaria Caetano: quem lê tanta notícia?

>