sexta-feira, 18 de outubro de 2013

BUDAPEST: anotações de viagem.

A Hungria, sua história e seus mistérios, já povoara os meus sonhos de criança, impressionado que fui – e fã ardoroso –, da obra-prima de Ferenc Molnár “Os meninos da rua Paulo”.

Nomes como Nemecsek, Tsonacosh, Chico Áts e o sagrado solo da comprida avenida Üllo... “que não acabava mais”... já prenunciavam aquele idioma incompreensível – que agora pude ouvir in loco –, como bem definiu Chico Buarque, “o único que o Diabo respeita”.

Eslovaco, o estrangeiro; o doce de nougat e o jogo de péla invadiram a minha mente infantil, que nem bem nem mal compreendia as complicadas questões da guerra fria no leste europeu, com suas cidades tristes, escuras e vazias de gente, de cores, de sons.

Budapest, em minha vida, 40 anos depois de lido o romance, enche-me de um outro sentimento invulgar. Um misto de resistência e teimosia permanentes, de “volta por cima”. Lenta, centenária, milenar. Quiseram os deuses que os húngaros conservassem seu torrão natal e sua língua materna única em meio a tantas na Europa central – eslavas, latinas, cirílicas...

Pouco mais de dez anos de moeda comum e os húngaros relutam em adotar o Euro, e permanecem com o dinheiro dos tempos de Molnár, o poético Florim. Bom para eles.

E eu fico pensando se o Brasil não teria algo a aprender com a distante Hungria. Relutar quanto à dominação cultural norte-americana, tanto quanto resistimos aos holandeses, franceses e espanhóis de outrora, permanecendo “inteiros” e brasileiros, numa só nação-continente, falando português em meio a castelhanos.

Relutar culturalmente, financeira e economicamente. Relutar estratégica e taticamente. Fazer “outra coisa”, de “outro jeito”. Meio-português, meio-italiano, meio-árabe, meio-libanês, meio-japonês, meio-africano e meio-índio: 7 matrizes para não morrer. E viver 7 vidas. Não sucumbir à imbecilização que nos querem imputar os media e os políticos profissionais com seus partidos de belas fachadas e espúrios acordos com a nossa cínica “elite”. 

Fazer de outro modo. Ser como uma Hungria milenar, resistente no coração da Europa, como aqueles meninos da rua Paulo defendiam seu gründ, seu lugar – se preciso fosse, com a vida.

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