segunda-feira, 1 de junho de 2009

Se a lei Rouanet mudar, então; só sobra um, meu irmão...

Ninguém deve surpreender-se com a tendência de 11 em 15 “patrocinadores-tipo-Rouanet” reduzirem seu marketing cultural (como "deu" na Folha de S. Paulo de 29 de maio último).

Da grande maioria das organizações que fundamentaram essa atividade em leis de incentivo (desde a Lei Sarney) só se pode esperar este comportamento, pois fizeram nada mais que promover-se às custas da renúncia fiscal.

Um titular desse time declara, na matéria, que "o projeto parte da ideia, equivocada, de que o governo sabe mais onde colocar o dinheiro do que o setor privado". É cristalino. Esse tipo de agente de marketing acredita que um Estado organizado, com instituições, leis, serviços públicos e orçamento é coisa menos importante que seu próprio umbigo. Não dá nem para começar a conversar - organizações geridas com esse tipo de "filosofia" têm mesmo é que perder qualquer acesso a incentivos fiscais.

Infelizmente, a maneira como tem sido conduzida a política cultural no Brasil nos últimos 23 anos (a Lei Sarney é de 1986), baseada quase que exclusivamente em incentivos fiscais, gerou esse tipo de pensamento. Demonstrei isto em minha tese e tenho escrito e contado essa "história" sempre que posso.

Apoiar a cultura com incentivo fiscal deveria servir para criar uma cultura de mecenato, o que, infelizmente, ainda não aconteceu. Há exceções, mas isto só reforça a regra. O incentivo – como acontece em qualquer país ou atividade – deve sair de cena em curto prazo. E ficam aqueles agentes que "aprenderam" e apreciaram os resultados a ponto de passar a destinar o que o ministro chama de "dinheiro bom" (parte de suas verbas de comunicação) ao financiamento ou apoio à viabilização de manifestações artísticas e espaços culturais, ajudando a dar forma (é claro que quem manda aqui é o artista, o criador), a atribuir preço (que remunere a ação mas que também esteja ao alcance do seu público), distribuir e promover – por tudo isso é que a atividade é de marketing cultural e não de engenharia cultural, arquitetura cultural, atitude cultural ou qualquer bobagem dessas que alguns inventam para ganhar dinheiro nas costas do artista.

O patrocinador contribui para que o artista, o grupo, o espaço, a arte enfim, ganhem espaço e procurem o seu público, o seu nicho no mercado, aumentando as opções de fruição da sociedade.

É muito bom saber que daqueles 15, quatro pretendem continuar patrocinando iniciativas artístico-culturais. Esses utilizaram melhor o incentivo fiscal (são exemplares da tal learning organization). E vão colher frutos dessa nova fase da filantropia menos pilantra. Nessa linha há, na matéria, um depoimento muito relevante: “o resultado final será positivo para a cultura e para os seus investidores. Dessa forma, a empresa não vislumbra dificuldades futuras na utilização de incentivos fiscais em programas culturais."

Melhor de tudo: um em 15 declarou que vai aumentar o patrocínio. É para onde devemos olhar. Um universo enorme de organizações que ficou à margem, até hoje, da farra dos incentivos (pois que isentas, ou que declaram renda pelo lucro presumido ou que estão em estados e municípios sem leis locais de incentivo à cultura). Temos que desenvolver esse tipo de ator. Temos que identificar esse tipo de mecenas (14 em 15 mecenas do Minc são fake). Temos que fundar o apoio à arte na ação daqueles que amam a arte, usufruem da arte em seu quotidiano e que por seu amor à comunidade [filantropia é isso e não fazer o bem (bem?) com o dinheiro alheio] resolvem doar um pouco de si ou de sua empresa ou de sua poupança à causa da criação e do enriquecimento cultural de todos.

2 comentários:

Mauro Marins disse...

Durante anos as empresas que se dispõem a investir dinheiro incentivando a cultura têm como principal objetivo os incentivos fiscais, mesmo apresentando lucros cada vez maiores, vide o Mercado Bancário, sem se importarem com a Cultura propriamente dita. Minha esposa foi uma bailarina contemporânea e estudava paralelamente na UFRJ, Farmácia, hoje se transformou em Professora Doutora da mesma instituição e abandonou totalmente a outra atividade, está errada? Infelizmente não, viver de cultura no Brasil é uma dificuldade até mesmo para “Globais”, que para lançarem um filme, uma peça ou qualquer movimento cultural levam anos em busca de patrocínio. Penso realmente que tínhamos que ter empresas ou pessoas que buscassem a Cultura não só para se beneficiar, mas para beneficiar a muitos outros que não possuem condições de assistir a um bom filme, uma boa peça e a um bom espetáculo, talvez se sentindo melhores como pessoa e não só como grande empresário.

Unknown disse...

É visível, acredito que para todos, que o objetivo da maioria da empresas, não é a preocupação com a cultura nacional e sim com o retorno fiscal e com o marketing que gera “apoiar a cultura”.
É uma pena que passados 23 anos da lei em vigor, as empresas não tenham compreendido a essência da lei e que com o patrocínio todos ganham: o artista, o espetáculo e o público. A arte é sempre tão deixada de lado em nosso país, tanto que poucos conseguem sobreviver única e exclusivamente dela. Não entendo como um universo tão rico pode ser tão pouco respeitado e deixado as margens.
Com a mudança na lei, as empresas que só enxergam os próprios interesses irão retirar suas verbas (ou reduzir bastante) e vão manter o apoio somente as empresas que tem visão global de que um povo enriquecido culturalmente é um ganho para todos. Temos que usufruir mais do que a arte pode nos proporcionar e dar apoio a aqueles mesmo com tantas dificuldades, deixam prevalecer seu amor e não desistem da arte.